O CRISTIANISMO INSTANTÂNEO
O cristianismo instantâneo
entrou em cena com a era da máquina. Os homens inventaram as máquinas com dois
propósitos. Queriam obter trabalho importante com maior rapidez e facilidade do
que se poderia conseguir manualmente, e queriam executar o trabalho de modo que
pudessem dedicar tempo a objetivos mais de acordo com seus gostos, tais como o
lazer ocioso e o gozo dos prazeres do mundo.
Ora, o cristianismo instantâneo
serve aos mesmos propósitos, na religião. Dispensa o passado, garante o futuro
e dá ao cristão a liberdade para seguir as mais refinadas inclinações da carne sem
qualquer constrangimento e com um mínimo de restrição.
Com “cristianismo instantâneo”
nos referimos ao tipo de cristianismo que se encontra em quase toda parte nos
círculos evangélicos. Ele nasceu da noção equivocada de que podemos praticar um
ou dois atos de fé e ficar aliviados de toda a ansiedade quanto à nossa
condição espiritual. Somos santos por vocação, continuamos a ouvir as pregações
da palavra, e daí inferimos que não há motivo para procurarmos ser santos pelo
caráter. Essa é uma falsa conclusão, completamente fora do estilo da fé do Novo
Testamento.
É verdade que a conversão a
Cristo pode produzir alegria, principalmente quando percebemos que fomos
perdoados dos pecados e agora somos filhos de Deus. Onde o fardo do pecado tem
sido pesado, a percepção do perdão é normalmente clara e alegre. O verdadeiro
cristão encontrou-se com Deus. Ele sabe que tem a vida eterna e provavelmente
sabe onde e quando a recebeu. Também aqueles que foram cheios do Espírito Santo
alegram-se pelo fato de sentir em seu coração a presença de Deus.
Mas o problema é que nós
tendemos a pôr a nossa confiança em nossas experiências, e, em conseqüência,
interpretamos mal todo o Novo Testamento. Não podemos esquecer de que há decisões
a serem tomadas, questões a serem resolvidas imediatamente. Há decisões que
podem e devem ser tomadas de uma vez para sempre. Há questões pessoais que
deverão ser resolvidas por um determinado ato da vontade em resposta à fé
alicerçada na Bíblia.
O cristianismo instantâneo
tende a tornar a fé um ato terminal e assim abafa o desejo de progresso
espiritual. Não entende a verdadeira natureza da vida cristã, que não é
estática, mas dinâmica e tendente a expandir-se. Omite o fato de que o novo
cristão é um organismo vivo, tal como um bebê, e precisa de nutrição e de
exercício para crescer normalmente. Não leva em consideração que o ato de fé em
Cristo ocasiona uma relação pessoal entre dois seres morais inteligentes, Deus
e o homem reconciliado, e essa relação deve ser aprofundada pelo exercitar de
uma amizade íntima entre eles.
Ao tentarem envolver tudo o que
constitui a salvação numa só experiência, ou duas, os advogados do cristianismo
instantâneo desprezam a lei de desenvolvimento vigente em toda a natureza. Ignoram
os efeitos santificantes do sofrimento, de levar a cruz e da obediência
prática. Passam de largo pela necessidade de treinamento espiritual, pela
necessidade de formar hábitos religiosos corretos e pela necessidade de lutar
contra o mundo, o diabo e a carne.
Uma exagerada preocupação com o
ato inicial de crer tem criado em alguns uma sensação de contentamento, ou pelo
menos de ausência de expectação. Isso infundiu certo desapontamento com a fé
cristã. Deus parece estar demasiado longe, o mundo está perto demais, e a carne
é poderosa demais para que se lhe possa resistir.
Outros se alegram ao aceitar a certeza de uma bem-aventurança automática. Esta sensação os exime da necessidade de vigiar, lutar e orar, e os deixa livres para gozarem este mundo enquanto esperam o mundo vindouro. O cristianismo instantâneo é uma ortodoxia do século vinte. Fico a indagar se o Senhor Jesus e seus discípulos reconheceriam tal cristianismo como aquele pelo qual morreram. Temo que não.
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