FÉ: DOUTRINA MAL COMPREENDIDA
No esquema divino de salvação,
a doutrina da fé é central. Deus dirige as Suas palavras à fé, e onde não há
fé, nenhuma revelação é possível. “Sem fé é impossível agradar a Deus”.
Todo e qualquer benefício
decorrente da expiação de Cristo vem ao indivíduo através do portal da fé. O
perdão, a purificação, a regeneração, o Espírito Santo; todas as respostas à
oração, são dados à fé e recebidos pela fé. Não há outro caminho. Essa é uma
doutrina comum aos evangélicos e é aceita onde quer que haja compreensão da
cruz de Cristo.
Porque a fé é tão vital para
todas as nossas esperanças, tão necessária para o cumprimento de toda aspiração
dos nossos corações, não nos atrevemos a tomar coisa nenhuma como líquida e
certa no que lhe diz respeito. Uma coisa que traz consigo tanto bem ou tanto
mal que, na verdade, decide o nosso céu ou nosso inferno, é importante demais
para ser negligenciada. Simplesmente é preciso que não nos permitamos ficar sem
informação ou mal informados. Temos de saber.
Já faz alguns anos, meu coração
tem estado inquieto quanto à maneira como a doutrina da fé recebida e ensinada entre
os cristãos em toda a parte. Nos círculos cristãos, grande ênfase é dada à fé. E
isso é bom; mas continuo inquieto. Especificamente, o que temo é que o conceito
moderno da fé não é bíblico; que, quando os mestres de nossos dias empregam a
palavra fé, não lhe dão o sentido que os escritores da Bíblia lhe deram quando
a empregaram.
Estas são as causas da minha
intranqüilidade:
1. A falta
de fruto espiritual nas vidas de muitos que dizem que têm fé.
2. A
raridade com que ocorre radical mudança na conduta e na perspectiva geral das
pessoas que professam sua nova fé em Cristo como seu Salvador pessoal.
3. O defeito
dos nossos mestres quanto a definir ou mesmo descrever aquilo a que se supõe
que a palavra fé se refere.
4. A
desanimadora frustração de multidões de interessados que, por zelosos que
sejam, nada conseguem extrair da doutrina e nenhuma experiência satisfatória
recebem por meio dela.
5. O real
perigo de que uma doutrina tão amplamente papagueada e recebida tão
acriticamente por tantas pessoas, seja falsa, nos termos em que a compreendem.
6. Tenho
visto a fé ser colocada como um substituto da obediência, uma fuga da
realidade, um refúgio para a evasão da necessidade de pensar com seriedade, um
abrigo para as personalidades fracas. Conheço gente que confunde fé com bom
humor meramente animal, com otimismo natural, com vibrações emocionais e com
tiques nervosos.
7. O puro
senso crítico deveria dizer-nos que qualquer coisa que não opere mudança no
homem que a professa, tampouco faz qualquer diferença para Deus, e é um fato
facilmente observável que, para incontável número de pessoas, a mudança da
ausência de fé para a fé não faz nenhuma diferença real na vida.
Talvez
nos ajude a saber o que é a fé observar primeiro o que não é. Não é acreditar
numa afirmação que sabemos que é verdadeira. A mente humana é estruturada de
tal maneira que, necessariamente, tem de acreditar quando a prova a ela
apresentada é convincente. Não pode evitá-lo. Quando a prova não convence, não
é possível fé alguma. Ameaças e punições não conseguem compelir a mente a crer
contra as claras evidências.
A fé
baseada na razão é um tipo de fé, é certo; mas não é conforme o caráter da fé
bíblica, pois segue infalivelmente a demonstração das provas e nada contém de
uma natureza moral ou espiritual. Tal fé nada mais é do que a conseqüência de uma
argumentação com provas do que fruto de uma convicção moral.
A fé
verdadeira firma-se no caráter de Deus e não pede mais provas que as perfeições
morais daquele que não pode mentir. Basta que Deus fale e, se a Sua declaração
contradisser cada um dos cinco sentidos e também todas as deduções da lógica,
ainda o crente continuará a crer. “Seja Deus verdadeiro, e mentiroso todo
homem”, é a linguagem da fé verdadeira. O céu aprova tal fé, porque ela se
ergue acima das meras provas e repousa no coração de Deus.
A fé,
como a Bíblia a conhece, é confiança em Deus e em Seu Filho Jesus Cristo; é a
resposta da alma ao Ser divino revelado nas Escrituras; e mesmo essa resposta é
impossível sem a ação interna do espírito Santo. A fé é dom de Deus à alma
penitente, e absolutamente nada tem que ver com os sentidos ou com os dados fornecidos
por eles.
A fé é
um milagre; é a capacidade que Deus dá ao homem para confiar em Seu Filho, e
aquilo que não resulte em ação conforme a vontade de Deus não é fé, mas algo
diferente.
Qualquer
fé que professar Cristo Jesus como Salvador pessoal e não colocar a vida do
crente sob plena obediência a Cristo como Senhor é inadequada e só poderá trair
sua vítima no final. O homem que crê, obedece; não obedecer é dar prova
convincente de que não está presente a fé verdadeira.
Para
tentar o impossível, ou Deus dá a fé ou não haverá nenhuma, pois Ele somente dá
a fé ao coração obediente. Onde há arrependimento real, há obediência; pois o
arrependimento não é apenas tristeza por erros e pecados passados, mas a
determinação de começar a fazer agora a vontade de Deus por Ele revelada a nós.
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